O leite de vaca é composto por uma variedade de proteínas, sendo a caseína a mais abundante, representando cerca de 80% do conteúdo proteico do leite. Dentro das caseínas, a β-caseína assume posição de destaque, constituindo aproximadamente 37% desse total. Notavelmente, existem duas variantes principais da β-caseína: a A1 e a A2.
Do ponto de vista nutricional, tanto o leite A1 quanto o leite A2 são praticamente idênticos em termos de proteínas, gorduras, carboidratos, vitaminas e minerais. A distinção crucial entre as β-caseínas A1 e A2 reside na composição dos aminoácidos na posição 67, onde a A1 apresenta histidina e a A2 apresenta prolina (Xiao et al., 2022).
Essa distinção presente nos aminoácidos tem um impacto significativo na digestão das proteínas do leite. Quando a β-caseína A1 é administrada à digestão por enzimas, ela gera um peptídeo bioativo de sete aminoácidos conhecido como "Beta-Casomorfina-7" (BCM-7). Por outro lado, a digestão da β-caseína A2 resulta em uma produção vantajosa menor de BCM-7. Vacas com o genótipo A2A2, que produzem exclusivamente a β-caseína A2, liberam quatro vezes menos BCM-7 em comparação com as vacas que possuem o alelo A1.
Pesquisas científica sugere que, até cerca de 8 mil anos atrás, todas as vacas produziam exclusivamente leite A2 devido à ausência de mutação genética responsável pela produção de leite A1. Posteriormente, ocorreu uma mutação genética em bovinos que levou à produção do leite A1. Essa mutação é mais comum em raças bovinas de origem europeia, pertencentes à subespécie Taurus.
A produção de leite A2 varia entre diferentes raças bovinas
Nas raças Holandesas e Pardo-suíças, há uma probabilidade de 50% de produção de leite A2, o que significa que metade dos indivíduos dessas raças possui o gene para a produção de leite A1. A raça Jersey tem uma probabilidade maior, atingindo 75% da produção de leite A2, o que significa que a maioria dos indivíduos dessa raça possui uma genética para a produção de leite A2. A raça Guernsey, embora seja pouco comum no Brasil, é caracterizada por todos os seus indivíduos serem capazes de produzir exclusivamente leite A2.
As raças zebuínas (subespécie Indicus), incluindo o Gir leiteiro, são predominantes na pecuária nacional, com cerca de 98% dos indivíduos dessas raças possuindo genética positiva para a produção de leite A2, pois a grande maioria dos bovinos zebuínos produz leite A2.
Também é destaque relevante o gado Sindi, originário da província de Sinde, no Paquistão, conhecido por ser uma das raças produtoras de leite com composição A2A2. Essa variante tem ganhado notoriedade crescente devido à sua menor propensão a causar alergias. O leite obtido das vacas da raça Sindi consiste exclusivamente de proteínas de β-caseína A2.
Nguyen et al. (2018) investigando os efeitos da β-caseína (β-CN ) A1A1 versus A2A2 observaram que o leite bovino contendo β-CN A2A2 apresentou diferenças significativas nas propriedades físico-químicas e micro estruturais em comparação com o leite contendo β-CN A1A1. O leite A2A2 apresentou percentual de cálcio livre significativamente maior e melhor capacidade de formação de espuma em comparação ao leite A1A1. Ambas as variantes do leite necessitavam de um tempo de fermentação semelhante para a produção de iogurte; entretanto, foi observado maior tempo de gelificação e menor módulo de armazenamento para o leite A2A2.
Assim, observamos um aumento significativo na demanda por leite A2A2. Países como a Nova Zelândia, líderes globais na exportação de leite em pó, iniciaram a produção desse tipo de leite em 2003, registrando oficialmente a marca A2 Milk e estabelecendo certificações para laticínios e fazendas dedicadas exclusivamente à sua produção.
A Austrália, outro grande player no mercado de exportação, também entrou nesse segmento. O que se destaca é que o produto não se limita mais ao público com alergia à proteína do leite, conquistando uma audiência mais ampla. Na Oceania, é possível encontrar leite e derivados A2 em diversas lojas e cafeterias, e o produto já é figura nas prateleiras de supermercados no Reino Unido e nos Estados Unidos. Com isso, o aumento na seleção genética dos animais com genotipagem A2A2.
Fonte: MilkPoint
Referências
EMBRAPA INVESTE EM BUSCA DO MELHOR LEITE PARA ALÉRGICOS. Disponível em:< https://www.em.com.br/app/noticia/agropecuario/2017/11/27/interna_agropecuario,919754/embrapa-investe-em-busca-do-melhor-leite-para-alergicos.shtml. Acesso em: 04/09/23.
LEITE A2A2: SAIBA POR QUE O SINDI GARANTE ESTE ALIMENTO. Disponível em:< https://www.girodoboi.com.br/destaques/leite-a2a2-saiba-por-que-o-sindi-garante-este-alimento/. Acesso em:04/09/23.
NGUYEN, H.TH., SCHWENDEL, H., HARLAND, D., DIA. 2018. Differences in the yoghurt gel microstructure and physicochemical properties of bovine milk containing A1A1 and A2A2 β-casein phenotypes. Food Research International, v.112, p.217-224. https://doi.org/10.1016/j.foodres.2018.06.043.
O QUE É O LEITE A2? Disponível em:< https://www.educapoint.com.br/blog/pecuaria-leite/o-que-e-leiteA2/ Acesso em: 04/09/23.
XIAO, S., WANG, Q., LI, C., WENJU LIU, W., ZHANG, J., FAN, Y., SU, J., WANG, H., LUO, X., ZHANG, S. 2022. Rapid identification of A1 and A2 milk based on the combination of mid-infrared spectroscopy and chemometrics. Food Control, v.134, p.108659. https://doi.org/10.1016/j.foodcont.2021.108659.